sexta-feira, janeiro 06, 2017

Será que tudo o que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda?


Ano novo, vida nova? Neste começo de 2017 eu resolvi colocar em prática uma resolução antiga: voltar pra academia. É que sabe como é, né? Estudos dizem que não funciona adotar todo um novo estilo de vida ao mesmo tempo, que as mudanças têm de ser graduais e que começar dietas nas segundas-feiras nunca dá muito certo. 2016 foi o ano da teoria da malhação. Li todas essas pesquisas aí [mentira, li notícias que mencionavam essas pesquisas] e, com isso, fui procrastinando as escolhas saudáveis da vida, hedonista que sou.

Enfim, o fato é que ontem, num embalo de quinta pós-trabalho, resolvi me matricular na academia. Depois de tudo devidamente protocolado e pago me perguntaram se eu já ia começar a malhar naquela hora – tomei um susto. Não precisa fazer a avaliação física (marcada devidamente para o dia 10/01) antes de começar a malhar? As duas moças, depois de trocarem um olhar jocoso, responderam em uníssono: “Magina!! Pode começar agora mesmo!”. Sem nenhum preparo psicológico para aquilo disse que começaria amanhã, hoje tava difícil.

Pois bem.

Academia já começa chato: primeiro há de se achar o melhor horário para malhar. Me conhecendo, resolvi que tinha que ser na hora do almoço ou nunca mais. Já tentei acordar mais cedo para nadar, por exemplo. Nadei uma única vez. Já tentei freqüentar aulas de ioga à noite e sempre preferi o conforto do bar lar. Depois de escolher o horário, você precisa pensar em todas as coisas que você tem que levar para a academia: malhar envolve suor, que envolve banho, que envolve toda a parafernalha de  uma nécessaire de viagem – xampú, sabonete, pós-xampú, pente, desodorante, tonificante, hidratante e perfume (sim, eu gosto de cuidar da minha pele). Como se não bastasse isso, ainda é preciso a roupa para malhar, a meia para malhar e o pênis, digo tênis, perdão, para malhar. E lembrar de descer na academia meia-hora antes da aula para reservar a bicicleta.

Check, check and check.

Até lembrar que esqueci a toalha.

Chegou o momento tão esperado. Pergunto qual é a sala do spinning. A moça me fala que a aula de spinning é só as 13h e que é lá em cima. Eu digo que não, que coloquei o meu nome na aula das 12h30, tenho uma bicicleta reservada, moça. “Ahhhhhhhhhh, é a aula de bike, nessa sala bem aqui em frente”, sempre com um meio sorriso sabe-nada-inocente na cara. Dou de ombros e entro na sala (a diferença entre spinning e aula de bike continua um grande mistério). Tímida, me apresento pra professora:
 – Oi, eu sou a Clara e eu nunca fiz uma aula de.. disso na minha vida.
- Ok, pode sentar na sua bicicleta, vamos começar já já.

A sala tem umas 15 bicicletas e as paredes são cobertas por espelhos, abrindo espaço apenas para um vidro que dá pra entrada da academia. Primeira coisa que me vem na cabeça? Que esses espelhos seriam mais úteis e divertidos em motéis. Depois, qual foi a do vidro? Me senti num aquário e sem Fagner nenhum para me fazer serenata. Pessoas ajustam suas bicicletas. Metida que sou, imito. Nada surte efeito, até porque eu não sei qual seria o efeito que era pra surtir anyway. Peço ajuda. Bike ajustada, a professora me passa as 3 posições e vai começar a aula. Breu. A música começa aos berros e luzes de todas as cores invadem o teto, os colegas, os espelhos. Subo logo na bicicleta com a esperança que ela me leve para longe daquela situação bizarra onde malhação, motel e boate viram um só.

Com o fôlego de fumante que tenho, rapidamente percebo o segundo erro, este mais fatal do que o da toalha: não trouxe água. #CaraDoEsqueceramDeMim. “E agora muda de moderado pra forte e vai pra posição 3! O torço não mexeeeee, manda essa bunda lá pra trás, lá pra trás”. Corei.

“Agora volta pra primeira e passeia...” – minha amiga, na boa, tu acha que isso é passeio? Fácil ficar gritando no microfone enquanto você caminha de maneira nonchalante na sala. Desgraçada, quero ver essa verborragia enquanto tu tá na posição 2, alternando perna. O nariz escorre, a legging cai, o cofrinho quase aparece. A morte, o último descanso. Tento, em vão, pedalar até ela.

“A aula só dura 30 minutos, então a gente tem que ir com força total [a gente quem, cara pálida?]! Sobe e fica, vamos alternar 2 e 3 durante 45 segundos”. CLARAMENTE A PROFESSORA NÃO SABE CONTAR. “Força, força, forçaaaaa”, só nessa já devem ter sido uns 10 segundos que não entraram na matemática nunca. ELA MENTIU. Diversas vezes. Eu queria protestar, mandar ela tomar no c* mas o fato é que eu já tinha deixado um pulmão na 34ª vez da posição 2 com força moderada, e abrir a boca só me deixava com mais sede. Quase pedi a água da colega mas achei que seria uma mancada nas regras de bon voisinage.


A aula acaba depois de um breve alongamento. Todos saem agradecendo à professora, eu grunho. Tremendo da cabeça aos pés, pego uma toalha na recepção e subo as escadas para o vestiário que nem vara verde. Seria um derrame, essa sensação? Bebedouro. Água, água, água. E mais um pouco de água. Separo todos os negócios-de-coisa de toalete e entro na ducha fria. Meu deus do céu, que livramento esse banho!!! Acostumei com chuveiro elétrico, então quando entro num normal, com a água toda cheia de pressão... é amor à primeira vista! Geralmente não demoro no banho, me sinto culpada por gastar a água do planeta, mas hoje.... ah, hoje, meu amigo, eu passei mais tempo no banho frio do que na aula. Segunda-feira volto, sobretudo pelo chuveiro.

sexta-feira, fevereiro 14, 2014

[Você e eu somos um] Caso Sério


Quando as coisas apertam aqui no trampo, eu penso em você. Não sei bem se isso ajuda ou piora a situação; cresce a expectativa do nosso próximo encontro e a minha boca enche d’água. Pensar em você me acalma e deixa irriquieta ao mesmo tempo. Quero que o dia passe rápido, mais rápido do que tudo, pra te ter nas minhas mãos. Porque aí a pressa se dissipa e já me contento de saber que você está ali, me esperando. Já passamos por algumas decepções e eu odeio quando isso acontece. Quando acho que você está em casa e não te encontro, dá um nó na garganta, uma vontade de chorar. Às vezes saio, vou pra rua. Confesso que, ocasionalmente, o intuito é te procurar por aí. Mas às vezes também fico com raiva de mim e dessa necessidade física da sua presença na minha vida – me rendo à cerveja.

Mas hoje eu não quero brigar com você. Não, quero primeiro ficar te olhando, assim de longe, de rabo de olho, com frio na barriga, antecipando o momento que com toda a solenidade de um ritual íntimo, vou tirar a sua roupa. Devagarinho. E sentir o seu gosto. Gosto esse que provoca euforia. Eu culpo a tal da endorfina, a sua densidade, intensidade.

Ansiedade controlada, nem sempre acabo com você. Gosto de te guardar para depois, de sentir a sua falta. Qualidade ganha de quantidade mas isso depende do dia, do vento e da lua. Já fui sua dependente. Química, mesmo. Já chorei quando terminamos e padeci de saudade. Mas eu volto, sempre volto, porque a nossa história é longa e você, meu cúmplice. Quantas noites passamos os dois juntinhos, vendo um filme? Na rua, na chuva, na fazenda. Nas viagens, nas mudanças, nas situações dificéis. Você é meu até eu enjoar.

Você me escorre por entre os dedos, me bagunça, me deixa com sede. E não adianta vir com guaraná pra mim, porque é você que eu quero beber. Meu preto, meu marrom-bombom, meu chocolate do dia-a-dia. Único companheiro fiel e mudo nas minhas terríveis TPMs.   

terça-feira, janeiro 21, 2014

Quando você passa eu sinto o seu cheiro



Alvo de reclamações, motivo de chacota, desencadeador de frouxos de riso intermináveis - o pum é um verdadeiro causador. Uma coisa, no entanto, é verdade: histórias de pum são hi-lá-ri-as. Pesquisando para esse post, chorei de rir lendo as mensagens que recebi.

A grande maioria das peripécias envolvem puns barulhentos – que, na minha mera opinião, são os mais lights. Em geral, o fedor não é tão forte quanto outros pums que circulam por aí. A primeira história que ouvi começa bem, começa lindo: numa sauna. Dois personagens eliminavam as toxinas do organismo, cada um no seu quadrado, cada um perdido nos seus devaneios. Não se conheciam, não trocaram palavras. Apenas suavam. Até que um deles deixa, sem querer, escapulir um pum barulhento.

*PROUT*

E agora, José? Pois bem, resoluto a não deixar que o seu corpo lhe pregue esta peça, nosso herói bate na parede

*TOC*
*TOC*
*TOC*

para disfarçar o pum. Infelizmente, as onomatopéias não bateram e o nosso ator coadjuvante, sabiamente, se esquivou da sauna e foi eliminar toxinas dentro da piscina, boiando.

Eu ri três dias com essa história. Juro que estou rindo agora, imaginando como não foram essas batidas na parede, tentando disfarçar o indisfarçável. Afinal, se um elefante incomoda muita gente, imagina o que um pum na sauna não causa como desconforto?

 Mas essa não era muito a minha idéia. Eu queria escrever sob a perspectiva feminina. O pum e a mulher. Afinal, somos reles mortais. E não comemos flores para peidar leite de rosas. Eles acontecem mas é meio que um assunto tabu. Já ouvi milhares de vezes que não é “bonito” mulher falar dessas coisas. Mas bom, elas acontecem e muitas vezes independentemente da nossa vontade. Nas minhas pesquisas, conheci o poder de um pum: teve garota musa-da-sala-de-aula que perdeu seu estatuto e todo prestígio em apenas alguns segundos, tudo por causa de um pum barulhento.

 E quem fala de pum de menina fala de depilação. TODAS as minhas fontes mencionaram gafes cometidas pós-cera. Bom, eu não quero entrar no mérito da depilação, mas que uma coisa fique clara: “onde os fracos não têm vez” é numa cabine dessas, cara-a-cara com uma moça mascarada e a sua cera quente. Depois de todo um processo e uma motanha-russa de sensações, depois de verificar com o espelhinho que está tudo ao seu grado, lindo, wuhuuull, etc, etc, algumas coisas mudam. E só voltam de 3 a 5 semanas, dependendo da lua na qual você se depilou. A primeira sendo o rumo do fluxo urinário e, a segunda, o volume dos puns.

Aconteceu, com uma pessoa muito próxima de mim, uma dessas histórias. Ela e um ótimo amigo estavam numa chácara de um terceiro amigo, arrumando as coisas para a festa que aconteceria dali a algunas horas. Estavam mudando a mesa de lugar, já tinham subido alguns degraus, pararam para respiram e, no que ela pegou o peso da mesa, *PUM*. Desses inofensivos porém altos. A reação dela? Brincar de estátua e permanecer na exata posição fatídica, esperando que ele, por algum milagre, não tivesse ouvido. Ele – levantou a cabeça, olhou pra cima, demorou uns 3 a 4 segundos para captar a mensagem e foi resolver outra coisa na cozinha. Ela, sozinha, riu horrores (e ainda ri).

Outra situação comprometedora é uma que envolve música, fones e e um reflexo tardio de infância: sabe criança quando esconde os olhos e, porque não está te vendo, acha que está escondida e que você não está vendo ela? Então, eu vinha pelo meu caminho, no metrô de Paris, todos os dias, sempre em pé, sempre com fone, escutando música aos berros. E sempre que eu tinha vontade de soltar pum, eu soltava, sem me preocupar muito. Me escondia atrás do fone e, com os pés de fora, todos sabiam não só onde eu estava mas sobretudo o que eu estava fazendo. E eu cantando baixinho, com um mega sorriso no rosto.
PIOR de tudo: quando as pessoas me olhavam, eu discretamente verificava que o zíper da minha calça estava fechado (vai que?!) e ficava me S-E-N-T-I-N-D-O, achando que eles estavam todos embasbacados com a minha beleza #SÓQUENÃO.

Isso durou uns 3 meses. Total impunidade gasosa nos metrôs de Paris. E eu só parei quando, um dia, andando e soltando pum e seguindo a canção, a minha irmã esbarrou por acaso comigo e me pegou pelo ombro (já que eu não ouvia os gritos dela vindo atrás de mim, correndo) dizendo: - Clara, que que é isso? Você sabe que você tá peidando alto?!

AHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH

No começo eu queria morrer. Eu jurava, mas eu jurava, que ninguém, nunca, tinha ouvido um pum meu. Pensei em todas os gatinhos com quem flertei, que eu achava que flertavam de volta mas na verdade estavam simplesmente atônitos com a minha cara-de-pau. E aí comecei a rir com a Julia. E talvez alguns pumzinhos tenham saído aí também, mas tudo bem. Porque com irmã a gente faz coisa muito pior. Perguntem a ela, e à mamãe e à Sofia sobre o pum direcionado – é tipo o pum amigo (que te segue para onde você vai) só que, como o nome indica, você direciona ele.

O problema mesmo acontece no trabalho. Pelo menos, esse é o momento que as minhas amigas se sentem mais constrangidas para soltarem um pum. E aí, vêm as estratégias de dissipação e outras artimanhas para evitar o olhar eu-sei-que-você-deu-pum-porque-eu-não-fui.
Tem a fofa – que guarda na primeira gaveta um perfume e, quando acontece do pum não ser esse amigo alto mas sim aquele rápido, silencioso e fediiido, faz pchiiit-pchiiit na sala inteira pra disfarçar o tal do odor. A amiga prática, que tem uma caixinha de fósforo sempre em mãos para neutralizar o gás. E tem a escrota, que solta o pum e vaza da sala, deixando para o(s) outro(s) o mal cheiro.

Em suma, da ânsia [de vômito] ao riso, todos nós passamos por esses diversos papéis. Um dia soltamos um pum, outro dia cheiramos um pum. Ainda bem que aqui no escritório, ficou estabelecido desde a segunda semana de trabalho, a regra do meu tio – que “terra onde tem criança e cachorro, adulto não peida”. Mas o problema é que o Gandhi, o nosso mascote, faz o tipo amiga escrota. Solta um pum, se assusta com o barulho e vai espairar a cabeça. Deixando a gente aqui, com um cheiro que só maçarico é capaz de neutralizar.

sexta-feira, agosto 09, 2013

Volta por cima


Vocês já repararam como a maçã sempre teve um papel importante na História? Foi por causa dela que Adão e Eva foram gongados do Éden. E a Branca de Neve?! Quase perde a vida numa dessas. Hoje ícone de um dos maiores impérios tecnológicos, a maçã, tal qual o Bombril, tem 1001 utilidades. Mas a sua principal função foi ter caído em cima da cabeça de um talvez preguiçoso mas com certeza sonhador Isaac, revelando assim a lei da gravidade.
Perguntando para as meninas qual era o aspecto mais enervante dela, ouvi quase sempre a mesma resposta: a ação da gravidade no peso. Isso se traduz em três palavras que assustam qualquer moça: teste do lápis. Algumas passam com 10 (sorry, meninas, mas aqui eu tiro onda), outras por um triz. E outras ainda repetem nas suas duas etapas - ESQ e DIR. A indústria cosmética, por exemplo, é completamente baseada nesse medo. Cremes que levantam, ácidos que empinam, massagens que modelam – tudo é friamente calculado para desafiar a equação GP².

Se desde Ícaro o homem sonha em voar é porque a lei da gravidade pode ser uma chateação. E eu, que não sou (nem de perto) a mais graciosa das criaturas, sofro - ela pega mesmo no meu pé.


Um tropeço é o triúnfo do homem sobre a lei da gravidade. Para meninas de 10 anos, representa todas as outras meninas que querem roubar o seu namorado. Quanto tempo nós não perdemos batendo o pé no chão dizendo: “não dou, não dou, não dou. É meu, é meu, é meu”? E todo mundo já se reergueu com um sorriso depois de ter sambado feito pai Francisco para evitar uma queda.
Mas quando ela é inevitável, sai de baixo. Cair é muito chato. Eu uma vez cai 12 vezes voltando para casa. Não porque tinha bebido demais mas porque Paris estava coberta de neve e a tupiniquim aqui não lida bem com a água nesse estado sólido escroto. O pior é que eu caía sempre do mesmo jeito, na mesma banda da bunda. Fiquei com um roxo meio amarelo, meio verde (olha a ironia) durante dois meses.
Outra vez, eu, jovem, gata carioca, fui flertar com um amigo via body language. Pensem numa péssima idéia: uma árvore, uma bica a 40 cm da árvore, e uma lata de lixo repletas de latinhas de cerveja vazias. Ele me viu. Eu sorri enquanto ele atravessava o jardim pra me dar oi. Gaiata, fui dar uma de desenvolta e me apoiar na árvore – um pé cruzado por cima do outro, fui me inclinando, certa de que meu cotovelo iria ser aparado pelo tronco e estaria eu ali, casual, sorrindo, louca pra dar e receber um cheiro do moreno. Só que não. Eu tava tão distraída olhando pro rapaz que calculei mal o ângulo, o cotovelo paralelo à àrvore. Resultado: fui de MADEEEEIIIRA no chão. De ladinho. E ainda levei a lata de lixo comigo – um strike completo e barulhento. Tão barulhento que todas as pessoas que tavam na pista de dança (bem em frente à situação) pararam pra entender o que tinha acontecido. É claro que o mocinho acompanhou a cena toda e, tudo de bom que é, saiu correndo, chutando lata (literalmente), pra me socorrer. Presa entre o tronco e a bica, eu só ria. E sangrava do cotovelo.


A lei da gravidade me irrita também quando faz os objetos caírem no chão. Quem nunca teve um iPhone com tela quebrada não viveu. Quem nunca pisou num micro caquinho de um copo quebrado seis meses antes (e que foi mi-nu-ci-o-sa-men-te recolhido) não sabe o que é dor. Quem nunca deixou a peteca cair não sabe o que é frustração. OK -- todos esses sentimentos são importantes pois são das experiências que vêm as melhores histórias, são dos traumas que nos reinventamos e da insatisfação que descobrimos novos caminhos.
Nesses dias de sol otimistas, talvez num domingo diferente (a começar por um estranho e leve bom humor matinal), você é atacado de novo: sim, pingou pasta de dente na sua blusa preta e você tem que trocar de roupa. Ou numa quarta-feira entusiasmada, o molho de tomate cai na sua calça de seda ou quem sabe até, num sábado preguiçoso, o café quente escorre na sua camisola preferida. O que Jackson Pollock chama de dripping eu chamo de lambança. E no meu caso, todas essas alternativas acontecem numa terça-feira atarefada no escritório e já não dá mais para trocar de roupa.

Pois é, não tá fácil para ninguém, colega. E se a lei da gravidade é tão antiga quanto o mundo, ultimamente ela arranjou uma péssima companhia: com a Lady Murphy, elas causam.

quarta-feira, julho 31, 2013

Domingo no parque



Eu não entendo muito o Garfield – não só o fato de lasanha ser o seu prato preferido mas sobretudo o fato dele odiar as segundas-feiras. Na boa, a segunda é um alívio, um respiro de sanidade mental e reconforto da rotina, o problema mesmo é o domingo, pé de cachimbo.
Domingos são o silêncio que antecede o esporro da semana, o dia que você pensa em todos os pepinos que deixou pendurados (afinal sexta à noite já é fds, seu lindo). Domingos têm gosto de cabo de guarda-chuva, preço a ser pago por um sábado inesquecível.

E quando você cria a coragem para pisar com toda a leveza de um elfo no chão – pessoalmente eu me sinto como um celular carregando até chegar a esse ponto –, o impacto traz à tona a dor de cabeça. [Ai]. E se domingo é o dia que deus tirou para descansar, é o dia que nós, reles mortais, tiramos para arrependimentos e promessas. Promessa de que não vai nunca mais achar que tem 18 anos e beber todos os 53 tipos de álcool do casamento. Arrependimento de pular a janela pra entrar em casa pra não fazer barulho. Promessa de que a partir de hoje, você é uma pessoa sensata e que vai dar total controle do seu celular à sua melhor amiga depois da segunda caipirinha. Arrependimento de tudo o que você mandou por mensagem às 4h da manhã para indivíduos de qualidades duvidosas.

Se a lógica cartesiana diz que o pensamento nos qualifica como seres humanos, eu não existo no domingo. A ordem do dia é evitar todo tipo de atividade física, incluindo descer as escadas. Exceções se aplicam quando o assunto é comida e, é claro, tirar o gelo da fôrma pra colocar na coca-cola.
Interações sociais são proibidíssimas – ao vivo e a cores, então, nem pensar. Whatsapp ainda vai; pros mais próximos que já sabem que blábláblás inúteis são intoleráveis, zero paciência. Aceito bafões e mesmo assim têm que ser muito bons. Telefonemas? Em casos muito específicos, cujos temas são emergenciais/WTF. Exemplos: “tá vivo(a)?”, “o que foi que aconteceu ontem?” e, eventualmente, “oi, você sabe quem é essa pessoa na minha cama?”.

Considerando o cenário caótico, a melhor coisa a se fazer é:

1.       Ir pra casa se você não estiver em casa (francamente, esse é o pior pesadelo de todos, contrariando dois dos meus princípios: 0 esforço físico & interação social para com o mundo);

2.       No eventual caso de se estar acompanhado, aconselho o uso dessa frase mágica que aprendi com uma amiga: “Então, você quer um café antes de ir embora?”. Hashtag fica a dica.

3.       Se você está, com a graça de deus, sozinha na sua cama, peça um McDonald’s por internet (sim, isso é possível!) e vá lavar a ressaca moral no banho. De preferência gelado.

O problema mesmo acontece quando você foi dormir linda e loira às 22h de sábado e acha que tem que aproveitar o domingo com os amigo tudo. Aí, neguinha, a sua segunda vira domingo e você levanta querendo lasanha.


quinta-feira, junho 13, 2013

Mama was a Rollin' Stone




A essa altura do campeonato, vocês já sabem que eu tenho três pais (um por parte da minha irmã Julia, outro por parte da minha irmã Sofia e o meu mesmo), nove irmãos, mais de 30 primos, uns 20 tios, 53 melhores amigos, etc, etc, etc; mas mãe mesmo é uma só, única.

A mamãe ri um riso largo, solar e quando as lágrimas escorrem, no auge da gargalhada, quando o fôlego fica curto e o ar acaba, ela funga. Eu também - condição genética, fazer o quê? Até a vovó Lili depois de um vinho do Porto a mais faz também. Cheia de manias contraditórias: não gosta de blackout mas dorme de tapa-olho, por exemplo. Porque o pai dela espirrava pra dentro (e isso dava gastura na menina), o espirro dela é um exorcismo. Ela se prepara, enche os pulmões de ar e AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHTCHIIIIIIIIMMMMMMMMM
Uma vez ela espirrou assim numa dessas galerias de Ipanema. Te juro que as pessoas saíram das lojas para ver o que tinha acontecido. O espirro ecoou durante três luas e dois eclipses, juro.

A mamãe adora uma tralha. A casa é cheia de breguetes do mundo - tem robô de San Francisco, flor de plástico da SAARA, bicicletas de Bellevile e da Austrália veio o Odorico. É jeitosa que só, faz laços incríveis e embrulha presente como ninguém. E a comida dela, do prato dela mesmo?! É sempre mais gostosa. E nunca, nunquinha, sai de casa sem tomar um gole d'água ou esquecer as chaves. Filha de Iansã, ela reluz e trovoa. Dedo verde faz da renda volume verde frondoso. Jasmim-estrela Buda alecrim dedo-de-moça cristais arruda defumador carvão. A mamãe é estado; de espírto e geográfico - a casa mora nela.

Lambe-lambe, identidades, lareira. Lambe as crias, micuim, ampliador. Vou agradecer a Santo Antônio que me deu essa guerreira de mãe, que de corpo fechado e coração aberto me dá o melhor dela, todos os dias. Mas quando joga praga, sai debaixo. É melhor não fazer birra e ouvir os conselhos, porque quando o tempo fecha, ele desaba.

Praga de mãe é mais eficaz do que macumba.

E isso, além de ser um fato, é um desses super-poderes que toda mãe tem. Porque sim, em certas coisas, mãe é tudo igual, só muda de endereço.
Vocês já repararam que toda mãe acha que os seus filhos são os mais bonitos; ou pelo menos foram os bebês mais bonitos do mundo? "Não digo isso porque eu sou mãe, trabalho com imagem, sou designer, fotógrafa, eu sei que vocês foram os bebês mais lindos", diria a minha. É EVIDENTE que nesse caso ela tá certa mas se a gente for seguir a lógica o-meu-filho-é-o-mais-bonito, não existiria gente feia no mundo. Zero. Nenhuminha.

O Tom Jobim tem uma frase ótima, que ilustra bem um outro dom materno: "Filho meu eu só crio até os 63 [lá em casa esse número vai aumentando conforme os filhos vão crescendo], depois que se vire!". Às vezes elas reclamam, dizem que vão embora, que não aguentam mais, mas é puro charme! No fundo no fundo, elas gostam e querem cuidar da gente. Seja com um beijo na testa pra medir a febre ou te mimando depois de um bad breakup.

Atire a primeira pedra quem nunca teve essa conversa com a sua genitora:

Filha: - Tchau, mãe!
Mãe: - Tchau? Onde você vai?!?!
F: - Pra casa do Miranda
M: - Ah tá! Tá levando casaco?
F, impaciente: - Não, mãe, tá quente, é dezembro, tô saindo
M, preocupada: - Mas leva uma casaco, filha, vai chover e semana passada você tava gripando...
F: - Ah mãe, já não peguei, já tô atrasada, já tô indo, beijotchau!
M: - Juízo, viu?
F: - Viu!
M: - Vai com Deus
F: - Amém

E é claro que é só colocar o pé pra fora de casa que o tempo vira e cai aquele pé d'água.




*                           *                           *

Participaram do texto, e têm o meu reconhecimento e carinho os grupos de whastapp:
Primas e agregadas
Lycee
Amigues

Um beijo no coração de vocês e um especial na minha pra sempre editora, irmã e passsseira Jubilú                

terça-feira, junho 04, 2013

A história de Lily Braun




 Me lembro como se fosse ontem do dia em que nos conhecemos: eu tinha 14 anos e ele um perfume doce, desses que dá vontade de experimentar. Foi numa festa, ele já era bem popular em alguns círculos mais rebeldes e eu fiquei desconcertada pela desenvoltura que ele provacava nas pessoas, naquela cena que parecia de filme...

No começo, foi meio estranho, me incomodou. Pra ser bem sincera foi desagradável. Mas, com o passar do tempo, ficamos cada vez mais próximos e cada encontro se tornou melhor. Evoluimos, paramos com as brincadeiras de criança e crescemos juntos. Ele ganhou espaço na minha vida, ocupou o meu tédio e sempre esteve ali para mim - alegrias, tristezas, insônias, bebedeiras. Eu e ele, ele e eu. Ele, que a cada despedida me deixava sem ar.
Me lembro específicamente de uma noite que passamos juntos lá em casa. Meus pais estavam viajando, colocamos Brel pra tocar, acendemos e lareira e abrimos um vinho. Aquele momento foi só nosso, um momento de liberdade onde o olhar preocupado dos pais não poderia recair sobre nós. Sem culpa, estávamos juntos, livres.
Coisas aconteceram e, por vezes, nossos encontros eram secretos. Sempre excitantes mas a paranóia que se instalava depois, de alguém reconhecer o seu cheiro em mim, era terrível. Briguei diversas vezes com a minha mãe - que sempre foi contra nossa relação. Tivemos uma conversa, eu e ele. Assumimos nosso caso. Muitos nos olhavam torto, outros ainda me chamaram de burra. Alguns o descreviam como se fosse o demônio. E isso, é claro, afeta qualquer relação. Não posso dizer que nunca brigamos. Quem não briga? Mas elas eram rápidas e antes de me dar conta, já estávamos de novo ali, naquele enlace. Eu precisava dele.

Outros amigos acolheram a gente. Talvez por se reconhecerem um pouco nos nossos hábitos ou por tolerarem a diferença. Juntos, conhecemos pessoas interessantíssimas - poetas malditos, artistas transgressores, arlequins anarquistas, enfim, pessoas que tinham essa vontade de mudar o mundo ou pelo menos a vontade de pensar o mundo em coletivo, de outra maneira. E tudo começava ali, todos nós juntos, debatendo, refletindo por intermédio dele. Me fascinava (e ainda fascina!) a facilidade que ele tem de instituir o silêncio como pausa necessária para a organização mental, para conseguirmos pensar na lógica argumentativa... Que dom, meu deus!

Ele, que tanto me proporcionou, fiel escudeiro e amigo generoso, foi vítima da mais comum e aleatória fatalidade: a vida. As coisas já não estavam tão bem entre nós, confesso que em grande parte por minha causa. Eu queria parar um pouco, pensar e ele não me deixava dar um tempo. Sentamos os dois juntos, eu com uma citação de Kerouac em mãos, ele mudo, ali, se consumindo, me consumindo:

Ventos poderosos que partem os galhos de novembro! - e o sol brilhante e calmo, intocado pelas fúrias da terra, que abandona a terra à escuridão e ao desamparo selvagem, e à noite, enquanto homens tremem em seus casacos e correm para casa. E então as luzes dos lares se acendem naquelas profundezas desoladas. Mas há as estrelas!, que brilham no alto de um firmamento espiritual. Vamos caminhar ao vento, absortos e satisfeitos em pensamentos maldosos, em busca de uma repentina e sorridente inteligência da humanidade abaixo dessas belezas abismais. Agora a fúria turbulenta da meia-noite, o ranger de nossas portas e janelas, agora o inverno, agora a compreensão da terra e de nossa presença nela: esse teatro de enigmas e duplos sentidos e pesares e alegrias solenes, essas coisas humanas na vastidão elemental do mundo açoitado pelo vento.

Jack Kerouac, 12 de novembro de 1947




Num domingo de junho à noite, senti o vento e o inverno. E eles trouxeram a inquietude, a vontade de me liberar do que tinha se tornado um vício. Eu li para ele aquelas palavras e, resoluta, terminei: com toda triste poesia que cabe numa ruptura, apaguei o que foi o último cigarro da minha vida.